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‘A universalidade do amor cristão’: primeiro artigo de uma série escrita por padre Sandoval Alves da Rocha sobre Encantar a Política

Dando continuidade a apresentação do Caderno Encantar a Política, fixemos a atenção no primeiro capítulo que tem como título “a universalidade do amor cristão”. Com esse título, o documento indica que fazer política é um gesto de amor. Não se trata do amor romântico e sentimental que é fartamente divulgado nos meios de comunicações, mas refere-se ao amor comprometido e duradouro que leva as pessoas buscarem aquilo que é o melhor para o conjunto da sociedade, tendo em vista o Bem Comum, a dignidade humana e cuidado da natureza.

Ao relembrar o ensinamento fundamental do cristianismo – amarás o teu próximo como a ti mesmo – o Caderno Encantar a Política amplia os nossos horizontes nos desafiando a alcançar com as nossas práticas e posturas os lugares e as pessoas mais distantes, principalmente àqueles grupos mais vulneráveis. Se o amor constitui prática básica da identidade cristã, a política possibilita que essa prática obtenha uma expressão mais abrangente e eficiente, englobando situações mais além do lugar em que nos situamos física e afetivamente.

Observamos a passagem de ações caritativas individuais à criação de instituições pautadas pela justiça e de estruturas solidárias. Uma instituição pauta o comportamento de todas as pessoas a elas ligadas porque cada uma deve cumprir o papel que a instituição determina.

Na medida em que a minha atuação política promove a criação de uma instituição que impacta positivamente a vida de muitas pessoas, inclusive na dinâmica social de um determinado lugar, a política potencializa a minha ação, tornando-a mais efetiva e contribuindo para a emergência de uma sociedade mais justa e solidária. Por exemplo, a construção de uma escola.

Por serem ações de repercussão social, elas encontram resistência nas pessoas que se beneficiam com as injustiças já instituídas. Assim, vemos uma contradição já prevista no fato da ação solidária trazer esperança e felicidade para muitos, mas também provocar ódio e rejeição nos setores privilegiados (banqueiros, mineradores, grandes empresários, milicianos). Há casos conhecidos em que a ação solidária em favor dos mais pobres provocou o ódio, levando à morte violenta. A atuação solidária de Marielle Franco, da Irmã Dorothy, de Chico Mendes, de Dom Phillips, de Bruno Pereira e muitos outros e outras.

A atuação política arraigada no amor é caracterizada pela busca do Bem Comum. Bens comuns são aqueles que pertencem ou são colocados a serviço de uma coletividade, para o uso comum. A rua, o transporte público, as redes de água, eletricidade e esgoto, o sistema de saúde pública e o serviço de polícia são alguns exemplos de bens comuns.

Comuns são também a água, o ar puro, a biodiversidade, o conhecimento, as técnicas e outros necessários à vida coletiva. Embora ameaçados de privatização, esses bens são por natureza comuns. Eles não devem ser propriedade de ninguém.

Por serem complexas e motivos de conflitos, é necessário que as ações políticas sejam estudadas e planejadas para melhor atingirem os seus objetivos. O amor expresso na ação política exige ser informado com conhecimentos provenientes das ciências políticas, da sociologia, da ética, da história, da filosofia, entre outras ciências. Por isso, é possível dizer que a política é arte, pois deve ser realizada, considerando os processos e estruturas profundas da realidade. No entanto, não se trata de uma arte elitista, mas uma arte popular, produzida por todos e para o benefício de todos. Política e democracia andam sempre juntas.

Além da contribuição das ciências, a política também ganha mais eficiência quando ela é realizada em sintonia com os movimentos sociais e organizações que expressam as demandas populares. Assim, essa ação deixa de ser algo somente individual e passa a ser uma ação coletiva, promovendo o sentimento de pertença, empatia e solidariedade universal.

Com a boa política alargamos o nosso coração, possibilitando que ele ame não somente o próximo, mas também o mais distante com as suas diferenças e particularidades.

Artigo publicado originalmente no Amazonas Atual. *Sandoval Alves Rocha é doutor em Ciências Sociais pela PUC-Rio, mestre em Ciências Sociais pela Unisinos/RS, bacharel em Teologia e bacharel em Filosofia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (MG). Membro da Companhia de Jesus (Jesuíta), atualmente é professor da Unisinos e colabora no Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (Sares), sediado em Manaus/AM.

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