“Visto que tudo está intimamente relacionado e que os problemas atuais requerem um olhar que tenha em conta todos os aspectos da crise mundial, proponho que nos detenhamos agora a refletir sobre os diferentes elementos de uma ecologia integral, que inclua claramente as dimensões humanas e sociais” (Papa Francisco, Laudato Si’, n. 137).
Eu morei cinco anos na Amazônia legal quando fiz uma experiência missionária na prelazia de São Félix do Araguaia (MT). Vivi aquele tempo precisamente em Canabrava do Norte nos anos de 2011 a 2015. Embora a região da prelazia seja chamada de Vale do Araguaia ou de Vale dos Esquecidos, como o denominou Pedro Casaldáliga, situa-se entre dois grandes rios, o Araguaia e o Xingu. Possui uma vegetação rica, pois é a área de transição entre os biomas do cerrado e da Amazônia. No fundo da casa onde residi, numa pequena chácara, ainda resta um bosque de floresta Amazônica. As árvores de grande porte e o frescor em meio ao escaldante calor da região impressionam.
Recentemente, passei uns dez dias na região amazônica, fazendo formação em Fé e Política, conversando precisamente sobre o projeto Encantar a Política. Aliás, o quarto capítulo do Caderno Encantar a Política trata da Amazônia. Primeiro, passei quase uma semana na região em que se forma o imenso rio Amazonas, chamado de rio Mar. Hospedei-me no seminário São José, em Manaus (AM), e pude visitar também Itacoatiara (AM), para onde fui em uma viagem de ônibus de seis horas. O espaço do seminário é belíssimo e preserva muito do que é a Amazônia: bem arborizado e as construções remetem ao mundo da floresta. Fiz um passeio de barco pelo rio Amazonas com uma entrada na floresta, numa área alagada e passei pelo “Encontro das Águas”. É maravilhoso ver que as águas barrentas do rio Solimões correrem lado a lado com as águas escuras do rio Negro por longos nove quilômetros sem se misturarem. Na floresta, pude ver uma sumaúma de trezentos anos (uma das maiores árvores do mundo que vive mais de setecentos anos). Enorme, imponente, suas raízes buscam água no subsolo e jorra na natureza pela respiração de folhagem abundante. Uma volta pelo centro de Manaus é suficiente para conhecer a riqueza que a Amazônia oferece. É uma enorme diversidade de cores, odores e sons típicos da região: frutas, sementes, peixes, entre outros. Colorido igual se vê nos artesanatos indígenas pela cidade. Os rostos nas ruas evidenciam grande quantidade e os diferentes povos indígenas. No território da Amazônia, são, ao todo, cento e sessenta etnias conhecidas.
Depois fui a Itaituba, no coração do estado do Pará, e daí segui noutra viagem de ônibus de nove horas para Santarém (PA), onde pequei o voo de retorno a Brasília (DF). Ambas as cidades estão às margens do rio Tapajós. Amazonas e Tapajós são rios muito grandes, com grande volume de águas e navegáveis. Repletos de grandes embarcações, quase não se avista a outra margem. A Amazônia é um dos biomas mais ricos do mundo. Nele, há vida em quantidade.
Essa entrada pelo território amazônico mostra que o papa Francisco tem razão: a Amazônia é sobretudo, vida! Vida de pessoas, culturas, animais, plantas, micro-organismos. A Amazônia guarda a maior biodiversidade do mundo. Porém, tudo isso está ameaçado. Francisco fala na encíclica Laudato Si’ que essa ameaça vem da ganância humana. Uma ganância suicida. A ciência prova que a Amazônia preservada é fundamental para a sobrevivência humana no planeta. Tanto a abundância de vida nela presente quanto sua influência no regime de chuvas em toda a América do Sul, o qual garante a produção de alimentos e o clima ameno, são de suma importância. No entanto, grandes grupos internacionais, com o apoio do governo brasileiro, querem esse patrimônio e essa riqueza imensurável no chão. Querem “passar a boiada”, ou seja: derrubar a floresta, não importa quanta vida há nela ou sua importância tenha para a vida no mundo. Querem derrubar a floresta para criar gado e plantar grãos. Na região do Mato Grosso em que morei, vi o ciclo do desmatamento se completar: derrubada da floresta para extrair a madeira, formação de pastos para o gado e, por fim, a chegada da lavoura. Aí, as últimas árvores são derrubadas. O resultado é o solo desertificado. Diferente do solo da Mata Atlântica, que conhecemos no sul de Minas, o qual é rico e a mata se recompõe rapidamente, o solo da Amazônia é pobre, composto praticamente de areia. Algumas vezes atolei o carro na areia. Além da agropecuária, o garimpo é outra ameaça à floresta e aos seus povos. O belíssimo e exuberante rio Tapajós tem em suas águas imensas quantidades de mercúrio usado nos garimpos clandestinos. As populações ribeirinhas, que dele tiram os peixes que a alimentam, vão sendo contaminadas dia após dia. Esses grupos gananciosos não consideram a imensidão da vida que há na Amazônia e sequer o fato de que a floresta em pé rende mais que derrubada. Uma castanheira, por exemplo, que produz a castanha do Pará ou castanha do Brasil, vendida a preço alto nos mercados do sudeste do Brasil e no mundo inteiro, dá muito mais dinheiro que as poucas cabeças de gado que possam pastar no mesmo espaço ou os cereais que aí possam ser cultivados.
Por isso, olhando para o futuro, precisamos nestas eleições escolher candidatas e candidatos que se comprometam com o meio ambiente, sobretudo a Amazônia, e que sejam filiados a partidos com comprometimento igual. Apostar na Amazônia e na conservação ambiental é garantir o futuro.
Artigo publicado originalmente no site da Arquidiocese de Pouso Alegre (MG). Padre Paulo Adolfo Simões é presbítero da Arquidiocese e secretário executivo do CEFEP.